Apesar do acesso à informação, os casos ainda ocorrem
Segundo dados do Datasus/2015 (Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde do Brasil) nos últimos 20 anos o número de garotas que engravidaram entre 10 e 19 anos em Diadema caiu 29,23%. No município, existem projetos voltados para essa problemática, porém o quadro se repete nas escolas e, na maioria das vezes, a maternidade precoce e a falta de apoio familiar e institucional influenciam na continuidade dos estudos.
Carolina Souza, mãe de Nathaly de 8 anos. Engravidou aos 15 anos, e conta que por causa da gravidez teve que abandonar sonhos e planos, como o intercâmbio marcado, naquele ano, para os EUA. Apesar de ter recebido apoio dos amigos e familiares, ela conta que ainda foi muito difícil se manter nos estudos durante os primeiros anos de vida de sua filha e que agora tem novos planos. “Continuei os estudos, porém eu repeti o terceiro ano, pois eu estava trabalhando, fazendo curso e estudando, acabei repetindo por causa de faltas, e não quis continuar”. Hoje, aos 24 anos, Carolina está no EJA (Educação de Jovens e Adultos), terminando o ensino médio e tem planos de fazer faculdade de fisioterapia no ano que vem.
Para muitas jovens, o convívio com colegas no ambiente escolar é um desafio, já que os interesses e as preocupações mudam após a maternidade, o que causa um distanciamento. É o que explica a psicóloga Angélica Capelari. "É a realidade que ela está vivendo e que os outros colegas não, então não é que os adolescentes possam excluí-la, mas são mundos diferentes".
Esse é o caso de Talita Zacarias de 24 anos, mãe de Lívia de 6 anos. Ela descobriu a gravidez aos 17 anos quando já estava no terceiro mês de gestação. Ela conta que os pais foram muito compreensivos e que quando revelou que estava grávida eles tiveram uma conversa franca com ela e o parceiro dela. Ela diz que o pai da criança a ajudou nos períodos mais difíceis da maternidade e estão juntos até hoje. Mesmo com todo o suporte, Talita parou os estudos pela vergonha de ir para a escola e ter que lidar com os colegas. “Eu sofri muita rejeição de amigos, ninguém queria uma amiga grávida. Era tudo muito diferente”, afirma.
Karen Oliveira é mãe do Samuel de 1 ano e 3 meses. Ela passou o último ano do ensino médio grávida, e revela ter tido dificuldades na hora de conciliar os estudos com a nova rotina "Eu só acabei os estudos por que tive ajuda da escola e da minha mãe". Karen além de estudar, trabalhava meio período como vendedora, durante a gestação, para ajudar com as despesas da casa, já que morava sozinha e o parceiro recebia pouco.
A atuação da escola é outro ponto importante a ser considerado, uma vez que a instituição tem o dever de informar e transmitir conhecimentos aos adolescentes, é o que explica a professora de Biologia Laís Melhardo “O papel da escola é fundamental principalmente no que diz respeito à informação, que, vinda da instituição, é mais segura, pois às vezes a família tem uma dificuldade de falar sobre o assunto com o filho, então, o papel da escola é essencial”.
Segundo a Lei 6.202/75, a estudante tem direito a uma licença de 3 meses a partir do oitavo mês de gestação e a oportunidade de fazer os exames finais, enquanto estes forem aplicados no período em que ela se ausentar da escola. Ademais tem tramitado, no ultimo mês, na Câmara dos Deputados um projeto de Lei (PL 2350/2015) que está aguardando parecer do relator da Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF), que inclui na Lei 6.202/75 o direito de acompanhamento pedagógico domiciliar a jovem que estiver afastada.
“O aluno quando se afasta, tanto por conta da gestação ou qualquer outro motivo de saúde, tem o direito de compensar essas ausências. Então vem um responsável, quando é o caso de ser menor de idade, e assina um termo do prazo de entrega de pesquisas e atividades”, explica a coordenadora da Escola Estadual João Ramalho, Diana Medeiros.
Em relação ao acompanhamento escolar, Carolina diz que sentiu falta de apoio e diálogo por parte da escola (professores e coordenadores) “não conversaram nada sobre, ou deram conselho [depois que eu engravidei], agiram normal só passaram os trabalhos deram as notas só isso”, afirma.
Além do auxílio que a escola oferece na maternidade, o município conta com projetos voltados para a temática, como o Estratégia Saúde da Família e o Programa Saúde na Escola, que vai até as escolas municipais e realiza palestras de conscientização sobre prevenção da gravidez precoce e de DSTs.
A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo em parceria com o Instituto Kaplan e de patrocinadores desenvolvem o Projeto Vale Sonhar dentro das escolas estaduais, no qual, são aplicadas oficinas que fornecem não só as informações para a prevenção, como envolvem os alunos em situações hipotéticas, nas quais seriam pais, como conta Laís “Existe a temática dentro do projeto e cada professor trabalha do seu jeito. Eu tenho a atividade do ovo, igual do Chris (referência ao seriado humorístico "Todo mundo odeia o Chris"). Eles trazem o ovo e cuidam na aula, porque é na prática que eles aprendem, tem uns que largam no canto. Mas essa é uma maneira de trabalhar a consciência deles do porquê não engravidar nessa época. Faço se perguntarem: Será que ganham alguma coisa? Mais perdem do que ganham.”
Hoje, na Escola Estadual João Ramalho, as matérias sobre educação sexual são inseridas nas apostilas de Biologia fornecidas pelo Estado de São Paulo e cada professor aplica o conteúdo da forma que achar melhor. Porém, mesmo com o acesso às informações sobre prevenção, os jovens ainda não se previnem em todos os casos, é o que afirma Laís “Se for hoje à sala e perguntar o melhor método para prevenir doenças e gravidez, eles vão responder: é a camisinha. E ainda acontece, pois na hora ‘H’ não há preocupações com isso, eles próprios contam que no ato se esquecem de usar o preservativo. É descuido, pois informação eles têm na escola, na mídia, nos postos.”
Esse foi o caso de Karen que, mesmo com as informações sobre os métodos contraceptivos e sempre mantendo diálogo em casa, ficou grávida do Samuel "Minha mãe é agente de saúde, então foi por um descuido. Eu sempre tive isso perto de mim." afirma.
Após a maternidade muitas vezes pode ser que ocorra a frustração por parte da garota que terá seus sonhos adiados, porém isso não quer dizer que ela nunca mais irá concretizar esses sonhos. "Ter que adiar a entrada em alguma faculdade, por exemplo, não quer dizer que ela nunca mais vai entrar em uma faculdade", é o que diz a psicóloga Angélica. Mesmo com a maternidade precoce, Karen já faz planos para voltar os estudos. "Eu já conversei com a minha mãe, ano que vem ela vai ficar com ele e eu vou voltar a estudar, fazer uns cursinhos”, e pretende entrar na faculdade de psicologia.
*Esta matéria foi produzida para a Faculdade no Segundo Semestre e foi feita em trio com Cinthia Guimarães e Natalia Canteli.
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